sexta-feira, 26 de março de 2010

A cartinha

A cartinha que mandei entregá-la foi carinhosa. Nós nos divertimos tanto, que eu não suportaria sair da sua vida repentinamente, como se nunca estivéssemos juntos, mesmo que por um dia, um ótimo dia. Então aproveitei a oportunidade que seus parentes estavam na cidade e escrevi uma pequena carta; sendo sincero não lembro tudo o que escrevi, mas anotei meu e-mail para que pudéssemos entrar em contato.  Ninguém sabia o que havia escrito, exceto eu, e ela, ao receber (a não ser que alguém tenha lido durante a transição).

Acharam engraçado, claro, o fato de eu escrever uma cartinha e ainda ter a coragem de pedir para enviá-la. Acharam bonito, também. Mas principalmente engraçado. E não gostei desse comportamento. Eu não deveria manter as amizades, mesmo que a 900 km? Eu não deveria corresponder um dia, uma amizade que cri sincera, uma conexão infantil e ingênua, pois éramos crianças? Não, não deixei que isso acontecesse. Rimos juntos, conversamos juntos, brincamos juntos, tomamos leite de vaca juntos, nos sujamos juntos. Era pra eu esquecer?

Era. Hoje ela me diz que vem à minha cidade. Mas só sei seu nome. Assim como entrei na sua vida, eu deveria sair?  Não sei. Depende. Entendi as risadas dos adultos, eu queria fazer parte de uma vida que eu não devia. Talvez eu esteja ficando adulto demais para meu gosto.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Sorriso a 384.405 km

Por que a lua me sorri? Aquela lua amarela no céu escuro reflete no quarto a beleza do universo. Não estou só, não estou na escuridão. O prazer de, mesmo entre quatro paredes, dormir ao luar. Será o gato de Alice? Será a Monalisa? Que mistério, uma lua que sorri. Sorri debochada, como quem esconde um segredo óbvio. Sorri bela, impetuosa, mesmo estando por trás das nuvens. De repente, escuridão. Mas eu sei que ela ainda sorri. Eu a procuro, procuro, mas ela não aparece. Foi encoberta. Então, um ponto branco brilha no céu, tímido, porém forte. Os contornos da grande nuvem se tornam mais visíveis. Então surge a lua, bem no centro da janela. Não é preciso movimento. Sorri um sorriso distante, sim, mas que nunca esteve tão perto, pois se desta distância posso enxergar, quer dizer que ela sorri para mim. E me dá um medo, esses sorrisos tão abertos.


Outra nuvem aproxima-se. E passa. A lua dardeja, magnífica, estonteante, absoluta. Outra nuvem a encobre. Não me preocupo, sei que ela está lá, e sorri. Forçadamente, proponho-me a sorrir também. Como poderia permanecer triste, se o universo me sorri? Amanhã, o dia vai ser bom.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Só sei que nada sei... (mas desta vez eu estava certo)

Decidi ler O Dia do Curinga (Jostein Gaarder, 1989) de tanto que me recomendaram. Até a vendedora da loja me disse (sem eu precisar perguntar), que alguns conhecidos seus já tinham lido o livro, e tinham achado melhor até que O Mundo de Sofia, do mesmo autor, traduzido em 37 países). Bem, eu já havia lido O Mundo de Sofia, e me mantive cético ao comentário da atendente (quand même, não deixei de soltar um longo "séééério?").



E eu não me equivocara. Ler o Dia do Curinga, depois de ler O Mundo de Sofia, é como ter uma aula de adição e subtração, mesmo que você já saiba multiplicar e dividir (just in passing, O Mundo de Sofia é ótimo, mudou meu ponto de vista sobre alguns assuntos, que antes pareciam incompreensíveis).


Mas isso não quer dizer que não deva ser lido. Tem lá seu charme. E alguns pensamentos me chamaram a atenção:


"Não conseguia entender como as pessoas conseguiam viver neste mundo sem se perguntarem, ao menos de vez em quando, quem eram e de onde tinham vindo. Como era possível fechar os olhos à vida neste planeta, ou então considerá-la 'evidente'?"


"E se existe uma coisa que aprendi com a vida nesta ilha é que depois de um dia sempre há outro."


"A vida é uma grande loteria, da qual só se veem os ganhadores."


"Conosco, meros mortais, a coisa é bem diferente: a gente envelhece, fica com os cabelos brancos, e um dia se acaba e desaparece deste mundo. Com os nossos sonhos, porém, a coisa é diferente. Eles podem continuar vivendo em outras pessoas por muito tempo depois de termos partido."


e: "Quem quer entender o destino, tem de sobreviver a ele."


Enfin, percebe-se que o Gaarder não estava pra brincadeira. Recomendo a leitura, afinal, filosofar nunca é demais.